Para lá dos batentes de uma porta como esta, há-de estar hoje o Francisco. Foi ontem operado e não o pudemos visitar. Não sabemos ainda como correu. E o verbo «operar» é, para nós, ainda intransitivo: não dizemos a que foi ele operado - nem a nós próprios, nem a mais ninguém. Esperamos, apenas. Do seu mais resguardado segredo, a porta olha-nos, silenciosa e cheia de luz. Olha-nos, com os seus dois olhos de vidro fosforescente. Desde ontem que nos fita, com os lábios selados pelo mutismo do seu segredo, no meio de dois braços abertos: «Esperamos, Senhor, que hoje, ao Francisco, Tu o Protejas por nós». Mas não sabemos, confessamos-te, o que nos reservas. «Não sei o que o amanhã me trará», terá deixado escrito o Fernando Pessoa, na sua hora da despedida. «Nem nós hoje, ó Fernando que foste 'Pessoa' de teu sobrenome. Nem nós hoje, para lá desta porta». Ontem perguntámo-nos várias vezes como teria corrido a operação. Vamos ver o que nos abrirá hoje o futuro anterior deste nosso tempo suspenso.
Sem comentários:
Enviar um comentário